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Aprendendo a velocidade de leitura…

Tenho um vício desenfreado por livros. De verdade. Praticamente beirando a bibliomania de Flaubert. José Mindlin é meu ídolo. Meu coração pertence aos livros impressos, mas também tenho uma queda pelas versões digitais.

Historiadora, doutoranda e escritora1, leio com bastante conforto na tela do computador, e com a coleção de livros da casa beirando o milhar, resolvi ser mais simpática aos e-books. O fato de meu marido ser sociólogo e professor, e de minha filha de dois anos já ser apaixonada por livros2 tem acelerado a contagem. Enfim, com o espaço nas estantes diminuindo, passei a ocupar também lugar no HD.

Ainda não adquiri um dispositivo de leitura propriamente dito, mas já possuo há bastante tempo um aplicativo no celular. Confesso que só tinha utilizado para ler um livro, O Cão dos Baskerville, o que foi feito em doses homeopáticas ao longo de muitos meses. No entanto, após abrir conta em um site que indica livros grátis, comecei a ler com um pouco mais de frequência no dispositivo, e hoje me dei conta que uma de suas funções me causa profunda ansiedade: calcular a velocidade de leitura.

Uma das coisas que adoro fazer é virar a noite lendo um livro do início ao fim. Há um prazer estranho em só notar que o dia já amanheceu depois de ler a última frase de uma obra. Obviamente, com um doutorado em vias de ser defendido e uma filha de dois anos, tal não acontece frequentemente. De qualquer forma, parte da adrenalina está em ver as horas passarem e a leitura avançar. O “será que vou conseguir terminar” é o meu equivalente ao looping de uma montanha-russa. O grande problema é lidar com certa culpa de fazer isso nas ocasiões que eu sei que deveria estar trabalhando ou dormindo…

Mas voltando às funções de leitura: eu não tinha prestado muita atenção ao “aprendendo a velocidade de leitura” até hoje, ao olhar rapidamente o começo de um novo livro. Normalmente minha atenção se volta às minúsculas letras no canto esquerdo da tela do celular quando marca a opção aprendendo, ou no final de um capítulo e seus X minutos para terminá-lo. No entanto, por algum motivo que desconheço, o aplicativo resolveu me presentear com o tempo total para terminar a obra: 11 horas e muitos minutos. Mesmo sabendo que eu não poderia finalizar a leitura nesse dia, o fato consumado em números me causou uma forte angústia.

Qual é a graça de saber em quanto tempo se vai terminar de ler um livro? Qual o motivo de compartimentar um prazer em horas e minutos? A vida moderna e a necessidade de realizar várias tarefas está realmente colocando um preço na diversão. É como um decreto de que aquele looping não vai durar para sempre. Tenho pavor de montanhas-russas, mas já andei em algumas para saber que se, ao invés de uma música interessante houvesse cronômetro regressivo informando os segundos entre o início e o fim da viagem, a burocracia da contagem diminuiria a diversão. Ou ao menos faria com que a adrenalina livre cedesse lugar à uma nada aprazível ansiedade.

Sendo assim, tenho as seguintes alternativas: escarafunchar o aplicativo em busca da opção de desabilitar a função ou ao menos relegá-la aos capítulos separadamente; ou tentar enlouquecer o sensor lendo cada capítulo em uma velocidade, o que dever ser divertido. Mas o melhor de tudo é sempre poder contar com o bom e velho livro impresso em que a única função é a imaginação. Obrigada, Gutenberg!

 

Lendo Oscar Wilde

 

1 Não pude adicionar blogueira à lista porque o “Lanchinho da Meia-Noite” tem sido bastante negligenciado. Mas prometo novidades quentes de Sangue Azul em breve. Muito em breve!

2 O livro favorito da Bebel que está nas nossas estantes, não na dela, e é um de meus preferidos: O Fantasma de Canterville, de Oscar Wilde. Mas mesmo uma mãe coruja tem que admitir que isso provavelmente se deva ao fato da capa ser rosa-shocking.

 

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